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Channel: Luís Graça & Camaradas da Guiné
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Guiné 61/74 - P18156: Blogpoesia (546): "Diante duma tela em branco...", "As obreiras do Natal..." e "Fábrica da amizade...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

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1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) três belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Diante duma tela em branco…

Concentrado. Pincel em punho. Olhando a tela.
A mente ferve.
Não sou pintor.
O pensamento vagueia.
Mira do alto e ao longe.
Como um condor.
De repente, sob um arbusto, algo que surge.
Desfecho-lhe uma frecha.
Faço uma presa.
Se inflama a fogueira.
Há labaredas.
Sentimento a arder.
É fumo branco.
Sem fumarolas.
Bate-lhe o sol.
Muda de forma.
Muda de cor.
Figuras rupestres.
Aves canoras.
Prados lacustres.
Searas doiradas.
Medas de trigo.
Ceifeiras cantando.
Debulham sorrisos.
Carradas de grão.
Enchem celeiros.
Moinho no rio.
Mó de moleiro.
Neve macia.
Farinha de pão.
Lindo quadro,
Poema de estio,
O vento secou.

Berlim, 24 de Dezembro de 2017
13h11m
Jlmg

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As obreiras do Natal…

Quando o Natal se avizinha, uma onda de ternura, quase divina, se apodera das nossas Mães e Avós.
Vem o sonho da felicidade a construir,
Adentro das nossas famílias.
Conseguir uma árvore. O pinheirinho. E enchê-lo de cores e luzes.
Cobrir-lhes os pés com as prendinhas,
A ninguém podem faltar.
Com o nome e as dedicatórias.
De quem para quem.
Com um lacinho a enfeitar.
Tudo à volta de um presépio,
Já vem da ternura dos antepassados.
Depois, vem a cozinha.
Aquela azáfama de tachos e de panelas.
A dispensa e o frigorífico estão a abarrotar de tanta química…
Na lareira em brasa, ardem as labaredas dos cavacos, de carvalho e de sobreiro.
O forno em cima, Deus nos perdoe.
Parece mesmo um inferno.
O sacrifício do cordeiro, com travessas de batatas tostadinhas.
Que cheirinho vai por toda casa.
O fogão ao lado, em ferro ou o eléctrico, se cobrem de tachos e de panelas.
Num, as batatas e as couves que a horta deu. Noutro, o bacalhau curado da Noruega, em postas bem medidas.
No outro lado, os filhos e as filhas, ajudam as suas mães no arranjo da doçaria.
A quem, por amor, vendem os seus segredos.
As filhoses. As rabanadas. As azevias.
Os “formigos” e a aletria.
Que regalo, só de vê-los.
Depois, vem a ceia, toda a gente,
Dos grandes aos mais pequenos,
Cada um o seu lugar.
Talheres e pratos reluzentes.
Dos vinhos, isso é tarefa do pai e do avô.
E, como há sempre um artista na família, no piano ou na viola,
Vem um fundo musical,
Para iniciar aquela festa da consoada e da alegria,
Depois da reza do avô…

Ouvindo "London Pops Orchestra"
Berlim, 25 de Dezembro de 2017
9h12m
Jlmg


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Fábrica da amizade…

Não seja gramínea. Planta rasteira. Raquítica.
Cresça nos montes. Nos vales e encostas da serra.
Fervilhe nas hortas. Jardins, ao pé das açucenas.
Regada de orvalho. Lágrimas quentes das faces fidalgas e pobres.
Fermente nos rios. Sobrenade nos lagos.
Fuja dos pântanos. Da lei dos mais fortes.
Abunde nos lares. Se troque nas feiras.
Sem lucro. Moeda de troca.
Desfaça a indiferença. Do vizinho da porta.
Rache o granito e cubra a calçada.
Seja tapete onde passe o mendigo.
Abra janelas e portas cerradas pelo egoísmo feroz e voraz.
Seja o espelho e o sino de todas as horas, lugares e ausências.
Fermente ao sol e à sombra. Mate a fome e a sede da seca.
Regue as gargantas de vinho e água pura da paz.

Berlim, 30 de Dezembro de 2017
17h29m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 24 de dezembro de 2017 > Guiné 61/74 - P18134: Blogpoesia (545): "Ver nascer mais um dia...", "A verdade das pedras..." e "Mais um pouco e...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

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